Poder Constituinte Derivado
13/04/2023Eficácia das normas constitucionais
13/04/2023O início da vigência de uma nova Constituição representa um marco importante na história de um país, pois significa a adoção de um novo conjunto de regras fundamentais que regem a organização do Estado e garantem os direitos e deveres de seus cidadãos. A vigência de uma norma jurídica, como a Constituição, corresponde ao período em que ela se torna obrigatória e pode produzir efeitos. A partir do momento em que uma nova Constituição entra em vigor, ela deve ser respeitada e seguida por todos os órgãos e entidades estatais, bem como pelos cidadãos.
A entrada em vigor de uma nova Constituição implica em diversas consequências jurídicas importantes, das quais se destacam:
- Revogação total da Constituição anterior: A promulgação de uma nova Constituição geralmente implica na revogação total da anterior. Isso ocorre porque a Constituição é a norma suprema de um país e, quando uma nova é estabelecida, substitui integralmente a anterior, que deixa de ter validade e aplicação. Essa substituição pode ocorrer por meio de um processo autoritário, como ocorreu no Brasil em 1967, ou através de um processo democrático, como a Assembleia Nacional Constituinte de 1988.
- Revogação das normas infraconstitucionais incompatíveis – Não recepcionadas: Quando uma nova Constituição entra em vigor, todas as normas infraconstitucionais, ou seja, aquelas hierarquicamente inferiores à Constituição, são analisadas quanto à sua compatibilidade com a nova ordem constitucional. As normas que forem incompatíveis com a nova Constituição são consideradas não recepcionadas e, portanto, revogadas. Um exemplo disso ocorreu no Brasil com a promulgação da Constituição de 1988, que revogou o Ato Institucional nº 5 (AI-5), publicado durante o regime militar.
- Validação das normas infraconstitucionais compatíveis – Recepcionadas: As normas infraconstitucionais que se mostrarem compatíveis com a nova Constituição são consideradas recepcionadas e, assim, mantêm sua vigência e aplicação. Esse processo de recepção visa garantir a continuidade da ordem jurídica e a estabilidade das relações sociais, políticas e econômicas. Um exemplo de norma recepcionada pela Constituição de 1988 é o Código Civil de 1916, que, apesar de promulgado sob a égide de uma Constituição anterior, continuou em vigor até a entrada em vigor do novo Código Civil em 2002.
Para que uma norma infraconstitucional seja recepcionada pela nova Constituição, é necessário que ela atenda a dois requisitos básicos:
- Norma vigente a seu tempo: A norma deve estar em vigor no momento da promulgação da nova Constituição, ou seja, não pode ter sido revogada por outras normas anteriores à Constituição.
- Norma compatível com a nova Constituição: A norma deve estar em consonância com os princípios, valores e regras estabelecidos pela nova Constituição, de modo a não contrariar ou violar suas disposições.
Dessa forma, o início da vigência de uma nova Constituição marca uma transformação significativa na ordem jurídica de um país, exigindo uma análise detalhada das normas infraconstitucionais existentes e suas interações com a nova Carta Magna. Essa análise é fundamental para garantir que a legislação vigente esteja alinhada aos valores e princípios constitucionais, assegurando a harmonia e a estabilidade do ordenamento jurídico.
A entrada em vigor de uma nova Constituição também traz consigo o desafio de adaptar as instituições e práticas estatais aos novos parâmetros constitucionais. Isso inclui a reforma de órgãos e entidades públicas, a revisão de políticas públicas e a capacitação de servidores públicos e operadores do Direito para a correta aplicação e interpretação das novas normas.
Além disso, a população deve ser informada e conscientizada sobre seus direitos e deveres estabelecidos na nova Constituição, garantindo assim que todos os cidadãos estejam cientes das mudanças e possam exigir o cumprimento das disposições constitucionais.
Em síntese, o início da vigência de uma nova Constituição é um momento crucial na história de um país, pois determina a reorganização do Estado e a atualização do ordenamento jurídico. Tal processo exige análises minuciosas e adaptações em todos os níveis da sociedade, de modo a garantir o respeito e a efetiva aplicação das normas estabelecidas na nova Carta Magna.
As situações que podem levar à recepção ou não de uma norma infraconstitucional por uma nova Constituição envolvem a análise de sua compatibilidade material e formal. A seguir, detalhamos cada uma dessas situações:
- Compatibilidade material e formal – Recepção: Quando uma norma infraconstitucional é compatível tanto material quanto formalmente com a nova Constituição, ela é recepcionada sem maiores problemas. Nesse caso, a norma se encontra alinhada com os princípios e regras estabelecidos na Constituição e foi criada de acordo com os requisitos formais exigidos.
- Compatibilidade material e incompatibilidade formal – Forma regida pela lei da época do ato: possibilidade de recepção: Se a norma é compatível materialmente, mas apresenta incompatibilidade formal, ela pode ser recepcionada desde que a forma seja regida pela lei da época em que o ato foi realizado. Exemplos notáveis incluem o Código Tributário Nacional (Lei 5.722/1966), recebido como Lei Complementar, e a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB (Decreto-Lei 4.657/1942), recebida como Lei Ordinária. Uma discussão relevante nesse contexto é a alteração de competência do ente que criou a norma, o que pode levar a questionamentos sobre a validade da norma recepcionada.
- Incompatibilidade material: Quando uma norma infraconstitucional apresenta incompatibilidade material com a nova Constituição, ela não é recepcionada. Para o Supremo Tribunal Federal (STF), essa situação não configura inconstitucionalidade, mas sim a não recepção da norma. Nesses casos, não cabe ação direta de inconstitucionalidade (ADI) ou ação declaratória de constitucionalidade (ADC). Um exemplo emblemático dessa situação é a Lei de Imprensa (Lei 5.250/1967). O STF manifestou-se sobre sua não recepção em uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF n. 130). Em 2011, o STF passou a admitir a modulação temporal da não recepção, permitindo que, em casos específicos, os efeitos da decisão de não recepcionar uma norma sejam limitados no tempo, para evitar prejuízos aos direitos adquiridos e à segurança jurídica.
Em síntese, a recepção ou não de normas infraconstitucionais por uma nova Constituição envolve a análise de sua compatibilidade material e formal, levando em conta os princípios, valores e regras estabelecidos pela nova Carta Magna, bem como os aspectos formais e competências dos entes que criaram a norma.
Referências:
- LENZA, Pedro. Direito constitucional. (Coleção esquematizado®). Editora Saraiva, 2023. E-book. ISBN 9786553624900. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553624900/ . Acesso em: abr. 2023.
- MASSON, Nathalia. Manual de Direito Constitucional. 9ª edição. Editora Juspodium, 2021.
- MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. Grupo GEN, 2023. E-book. ISBN 9786559774944. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559774944/ . Acesso em: abr. 2023.