Pós-modernismo, Boaventura e o direito
15/08/2014Profissões jurídicas: Advocacia (I)
17/11/2014A palavra “profissão”, no Brasil, costuma ser usada, em termos populares, de um modo quase indiferente. É comum referir-se a qualquer trabalho ou atividade como uma “profissão”.
Quando, porém, a palavra vira uma qualidade, passa a ter contornos mais próprios. Muitas vezes ouvimos uma pessoa pedindo a outra para ser “profissional” ou agir com “profissionalismo”. Também podemos elogiar o “profissionalismo” de um trabalhador.
Nesses últimos usos, a palavra indica algumas características que o trabalhador possui ou deve possuir. Entre outras, podemos pensar no modo como executa sua atividade (com dedicação, estudo, afinco…) e no modo como trata seus colegas e clientes (respeito, distanciamento…).
Na sociologia das profissões, por sua vez, a palavra é usada para diferenciar um tipo de trabalho de outros. Vamos, aqui, apresentar as características da categoria sociológica profissão e problematizá-la a partir de tensões decorrentes dessas características e das transformações sociais do presente.
Primeiramente, registremos um termo neutro, capaz de designar qualquer atividade remunerada desenvolvida no mercado por uma pessoa: ocupação. Assim, em qualquer mercado existem várias ocupações (trabalhos, empregos, profissões…). Nem toda ocupação é uma profissão; toda profissão é uma ocupação. Surge, desse modo, a questão sociológica: quando uma ocupação se torna uma profissão?
A partir da obra de FLEXNER (1915), os primeiros estudiosos do tema indicam que, para se tornar uma profissão, a ocupação:
- deve ser intelectual, ou seja, sua atividade exige um conhecimento próprio (expertise), possuído pelo trabalhador;
- esse conhecimento é mais prático que teórico, consistindo em um conjunto de técnicas para a resolução de problemas;
- embora tal conhecimento possa ser aprendido, não se converte em uma mera rotina, exigindo sempre uma individualização do trabalhador no momento da atuação (advinda da experiência, do talento, do instinto);
- além disso, a profissão deve ser prestada com grande responsabilidade pessoal, exigindo o respeito a padrões éticos de desempenho e prestação do serviço;
- e deve motivada pelo altruísmo, vendo-se o trabalhador como alguém atuando pelo bem da sociedade ;
- há, por fim, uma forte organização do grupo que desempenha a atividade.
A caracterização é criticada por, conforme os sociólogos posteriores, acreditar no papel que o grupo profissional diz desempenhar. A partir, sobretudo, da obra de FREIDSON, constata-se que não há elementos fixos no conceito de profissão, sendo essa categoria sujeita às transformações sociais.
Em termos genéricos, pode-se afirmar que a profissão existirá se um grupo profissional obtiver status social (reconhecimento, prestígio, riqueza…) e autonomia ocupacional.
A autonomia é obtida com a organização do grupo em associações ou entidades, que passam a atuar politicamente pelo seu fortalecimento, e pela aquisição do controle de:
- acesso ao mercado – o grupo define quem pode ou não atuar na profissão;
- padrões de prestação – o grupo estabelece as formas consideradas corretas de atuação para a resolução de cada tipo de problema relativo à atividade e cada profissional em si, com base nesses padrões, decide o que fazer, como e quando desempenhar a atividade;
- conhecimento – o grupo interfere na consolidação científica das técnicas necessárias para o desenvolvimento de suas atividades, exige que o candidato a membro da profissão receba uma formação superior ligada a essa ciência e busca controlar o acesso a ela.
O controle profissional, em especial sobre o mercado e sobre o conhecimento, gera uma situação econômica de monopólio no ramo de atividade. Apenas os membros da profissão podem atuar no setor, estando todos os outros impedidos. Como exemplos, podemos pensar na medicina (só os médicos podem praticá-la) e no direito (só o advogado pode peticionar).
Do ponto de vista econômico, as situações de monopólio costumam ser vistas como indesejáveis. Assim, caso haja alguma limitação à livre iniciativa e à concorrência, ela deve ser justificada. Coloca-se então a dúvida: as profissões são apenas ocupações monopolizadas por grupos que se beneficiam dessa situação ou há razões superiores para tais monopólios?Em outras palavras, os profissionais apenas pensam em seus próprios bolsos, desejando enriquecer, ou agem em nome de valores coletivos que justificam o benefício econômico?
Adam Smith, um dos pais do liberalismo, defensor da concorrência, curiosamente, quando se trata das profissões, especificamente do direito e da medicina, defende o monopólio. Segundo ele, caso não houvesse controle na entrada de pessoas em uma profissão, o valor dos serviços cairia pela elevação da oferta de trabalhadores. Com a queda da remuneração, pessoas de caráter superior não seriam atraídas pelas atividades, que seriam tomadas por pessoas de caráter inferior. Isso levaria a um decréscimo de qualidade dos serviços. Como tais serviços atuam em áreas de grande importância, isso não poderia ocorrer.
Citamos literalmente uma passagem célebre do autor: “depositamos nossa saúde ao médico, nossa fortuna e às vezes nossa vida ao advogado. Tal confiança não poderia ser depositada, de modo seguro, em pessoas de condição menor ou mesquinha. A recompensa a eles deve ser tal que permita figurar na sociedade de modo tão importante quanto a confiança exige” (em A Riqueza das Nações).
Economistas e sociólogos, porém, criticam a situação de monopólio. Da perspectiva econômica, as profissões permitem, graças às restrições à concorrência, um aumento de remuneração acima do padrão normal de outras ocupações, sem incentivar a inovação e o progresso técnico do setor. Assim, os serviços executados por profissionais tornar-se-iam atrasados, do ponto de vista tecnológico, e caros. Isso interessaria apenas aos prestadores dos serviços, não aos clientes ou à coletividade.
A partir de FREIDSON, outros sociólogos como JOHNSON e LARSON enfatizam a ideia de que as profissões consistem apenas em monopólios de setores da economia, justificados por uma retórica falsa de que seriam indispensáveis para manter a qualidade dos serviços. Um dado novo que entra nessa análise é a necessidade de conquistar o apoio do Estado para a obtenção, por meio de leis, desses monopólios.
É claro que os grupos profissionais defendem sua posição afirmando que há, de fato, em suas ocupações, um caráter socialmente relevante a justificar as restrições à concorrência. O profissional deve preocupar-se apenas com a prestação adequada de sua atividade, pensando nos valores que busca satisfazer a seu cliente (justiça, saúde…). Se precisasse, além disso, preocupar-se com dinheiro ou com a concorrência de outros grupos, a qualidade dos serviços decairia. Por isso, haveria a necessidade de controlar o ingresso de novas pessoas na profissão (diminuindo a oferta) e a competição com outras ocupações.
Independentemente de qual discurso tenha maior razão, há um dilemaque parece marcar as profissões: trabalhadores de alta qualidade cobram preço alto e são acessíveis a poucas pessoas; trabalhadores de menor qualidade cobram preços baixos e atingem mais pessoas. Como democratizar o acesso aos serviços profissionais sem diminuir a qualidade dos serviços prestados?
Um exemplo prático disso ocorreu com a medicina privada brasileira. O advento dos planos de saúde barateou o acesso a muitos médicos, de diversas áreas; a qualidade dos atendimentos, porém, decaiu significativamente. É notória a diferença de uma consulta particular, sem plano de saúde, doutra com plano de saúde.
Uma possibilidade de evitar esse dilema seria a intervenção do Estado, subsidiando determinados profissionais de qualidade para atender o público de baixa renda, ou até estatizando alguns setores. Um risco dessas alternativas é o desestímulo que gera ao aumento da qualidade ou à inovação tecnológica.
Também poderia ser criado um mecanismo regulatório para manter patamares elevados de qualidade a todos os profissionais de uma categoria. Mas dois problemas podem surgir: primeiro, esses patamares de qualidade podem inviabilizar a redução dos preços dos serviços; segundo, quem faria tal controle? Se o controle fosse feito pelos próprios profissionais, há o risco do corporativismo. Se feito por outras pessoas, externas, há o risco da incompreensão dos reais patamares de qualidade do serviço.
O dilema gera um desafio difícil de ser resolvido e pode virar mais um argumento contrário ao próprio profissionalismo.
A estudiosa Magali LARSON criou uma categoria de análise que se tornou fundamental para a sociologia das profissões: projeto profissional. Seu ponto de partida é a noção de que as profissões modernas derivam de dois fatores históricos:
- livre mercado
- conhecimento científico
A possibilidade de qualquer grupo de pessoas chegar a um conhecimento especializado e poder prestar serviços de modo remunerado, livremente, em um mercado, permite a profissionalização. Disso decorre o projeto, que consiste na busca pela passagem do grupo de uma ocupação a uma profissão. Para tanto, é fundamental monopolizar o conhecimento especializado para buscar, junto ao Estado, o monopólio do mercado.
O projeto profissional seria a soma de ações e atitudes dos membros de um grupo, deliberadas ou não, que permitem a conquista plena da autonomia (controle do mercado, dos padrões e do conhecimento).
O principal objetivo do projeto seria o controle do mercado (monopólio). Para tanto, haveria a necessidade do “fechamento social” do grupo, ou seja, a exclusão de pessoas indesejáveis da categoria e a inclusão daqueles que preenchessem os requisitos determinados pelos próprios membros, e da obtenção do apoio estatal, por meio da criação de leis restringindo a concorrência.
O tema do fechamento social é bastante estudado na sociologia das profissões. Esse fenômeno permite o controle de acesso ao mercado, limitando a quantidade de prestadores de serviço em um ramo e aumentando o valor das remunerações. Seu interesse sociológico deriva do espelhamento, no grupo “fechado”, dos preconceitos e das injustiças presentes na sociedade como um todo.
A justificativa para o fechamento varia historicamente, mas oscila entre duas características que o trabalhador deve possuir para poder fazer parte do grupo:
- o caráter respeitável ou “nobre”, indicando tratar-se de pessoa preocupada, antes de qualquer motivo econômico, com a resolução correta do problema do cliente, sendo merecedora de sua confiança;
- o conhecimento técnico especializado, obtido por meio de formação superior, indispensável para a atuação acertada.
Pessoas que não possuem o caráter adequado e/ou a formação suficiente não podem fazer parte do grupo. Isso exclui das profissões, conforme o contexto social, mulheres, minorias, classes economicamente desfavorecidos, pessoas sem acesso à educação superior…
O projeto profissional envolve outros objetivos secundários além do monopólio. O grupo busca autonomia na definição dos padrões éticos e técnicos de prestação dos serviços, determinando o que é certo e errado na profissão e controlando o julgamento de seus pares pelos possíveis desvios de conduta. Em termos individuais, como mencionado acima, essa autonomia significa a liberdade de o trabalhador determinar o que, como e quando fazer algo.
Outro objetivo secundário buscado é o controle da produção dos novos profissionais. Esse controle liga-se ao tema dos controles do conhecimento científico especializado e do mercado, materializando-se na definição dos mecanismos de seleção dos candidatos a profissionais, dos requisitos acadêmicos necessários para participar da seleção e de meios de treinamento dos selecionados.
Tais definições devem levar à formação de novos profissionais que correspondam ao padrão desejável de trabalhador, seja do ponto de vista técnico, seja do ponto de vista ético. A grande ambição do grupo que executa um projeto profissional é o controle das próprias instituições educacionais, difícil de ser satisfeita em contextos de massificação do ensino.
Um último objetivo secundário é a respeitabilidade social. O grupo almeja ser visto pela sociedade como composto por pessoas seletas, realizando um tipo de trabalho especial, envolto por valores relevantes e exigindo um conhecimento altamente especializado. Com isso, obteria mais status e valorizaria ainda mais suas atividades.
A execução de um projeto profissional ocorre em um ambiente no qual agem outros atores que podem favorecê-lo ou comprometê-lo. Um ator fundamental é o Estado, com o qual o grupo deve entrar em “barganha regulatória”, ou seja, em negociação para obter, por meio de leis, a autonomia. Muitas vezes, outras ocupações podem se opor ou se associar ao projeto do grupo, devendo ser levadas em consideração (exemplos: podemos pensar em situações envolvendo conflitos e complementaridades entre médicos e farmacêuticos ou entre advogados e contadores).
Na sociedade capitalista avançada, as organizações (grandes empresas, instituições, associações, fundações…) podem conflitar com grupos profissionais, inserindo-os dentro de sua burocracia, submetendo-os a leis gerais e abstratas que inviabilizam sua autonomia técnica e ética, transformando-os em meros assalariados.
Também não podem ser desconsideradas as instituições educacionais que, em determinadas situações, podem tornar-se fortes e realizar oposição a aspectos do projeto profissional, como, por exemplo, o controle sobre acesso ao mercado, o controle sobre o conhecimento e o controle da produção de novos profissionais.
Um último ator, fundamental para a execução do projeto, é a clientela. São os membros da sociedade que pagarão pelos serviços do grupo profissional e que devem ser convencidos de que contratam as melhores pessoas para resolver um tipo específico de problema. Se não acreditarem que o problema merece tratamento de um especialista, o resolverão sozinhos ou com auxílio de pessoas não especializadas, ameaçando a existência da profissão.
Para finalizar esta apresentação sociológica, destacamos o tema do conhecimento profissional. ABBOTT (1988) considera que o papel dos profissionais na sociedade é resolver problemas humanos por meio da prestação de um serviço especializado. Esses problemas podem ser individuais, de grupos determinados, ou de toda a coletividade. Assim, advogados resolvem problemas ligados à prevenção e resolução de conflitos; médicos, à saúde individual ou coletiva.
O processo de resolução de um problema, pelo profissional, envolve um raciocínio caracterizado pela abstração. O trabalhador pensa em um sentido que caminha, constantemente, do concreto para um sistema de conhecimento abstrato e, dele, de volta para o concreto. Esse sistema de conhecimento abstrato permite ao grupo definir em linguagem própria os problemas que resolverá, resguardando sua esfera de atuação da investida de outros grupos.
Segundo ABBOTT, o raciocínio profissional, nesse caminhar entre o concreto e o abstrato, envolve três fases (aplicáveis a quaisquer profissões):
- Classificação do problema: também chamada de diagnóstico ou identificação, é a fase na qual o profissional busca, no sistema de conhecimento, informações que permitam catalogar o caso concreto em que atuará;
- Racicínio/argumentação sobre o problema: é a fase da inferência, ou demonstração lógica, ou da deliberação sobre o problema, na qual o profissional analisa, a partir da classificação, quais os possíveis caminhos para resolver o problema, verificando aspectos positivos e negativos de cada um deles;
- Ação sobre o problema: depois da deliberação, o profissional atua, resolvendo ou tratando o problema a partir de informações contidas no sistema de conhecimento.
Podemos utilizar essa análise para compreender os procedimentos racionais de um médico ou de um advogado. O médico, num primeiro momento, realiza o diagnóstico da doença (fase 1); depois, analisa os possíveis tratamentos (fase 2); por fim, partindo de sua ciência abstrata, executa os procedimentos para tratá-la (fase 3). No caso do advogado, primeiro qualifica juridicamente o caso, identificando o ramo do direito a que pertence (fase 1); depois, analisa as possíveis medidas judiciais ou extrajudiciais adotáveis e interpreta a legislação (fase 2); por fim, toma a providência cabível, como a elaboração de um contrato ou de uma petição (fase 3).
Uma questão fundamental para justificar o monopólio ocupacional é a singularidade do raciocínio profissional. Haveria algo intrinsecamente humano, insuscetível de ser transformado em um padrão científico ou em um programa de computador, na atividade profissional? Ou o conhecimento profissional poderia ser sistematizado na íntegra, eliminando a necessidade de um grupo especializado para resolver determinados tipos de problemas?
ABBOTT retrata um pouco dessa tensão ao afirmar que o profissional deve equilibrar-se entre a mera técnica e a abstração científica. Caso caia em um dos extremos, perde credibilidade. Mas o tema ganha contornos mais interessantes com os sociólogos JAMOUS e PELOILLE, utilizando a palavra indeterminaçãopara indicar esse aspecto exclusivamente humano que haveria no conhecimento profissional.
A indeterminação seria o elemento subjetivo que permite o julgamento profissional, podendo ser chamado de experiência, instinto ou talento. Quanto mais desse elemento houver em uma profissão, mais fácil torna-se justificar o monopólio e menos suas atividades podem ser rotinizadas e controladas externamente.
Toda ocupação teria uma porção de indeterminação e de tecnicalidade (chamada por eles de IT ratio). Quanto maior a tecnicalidade, mais as atividades profissionais podem ser convertidas em uma rotina automática que pode ser executada por qualquer trabalhador, mesmo sem treinamento especializado. Quanto maior a indeterminação, mais indispensável é a figura subjetiva, concreta, de um profissional.
O raciocínio profissional, assim, vive uma constante tensão entre as forças que tentam transformar as atividades do profissional em mera rotina sistematizada, por um lado, enfraquecendo o projeto profissional do grupo, e as forças que buscam enfatizar a indeterminação dessas atividades, sujeitas à experiência, ao instinto ou ao talento individual do prestador.
Essa tensão faz surgir temas dos mais relevantes para o presente: a burocratização, a proletarização e a comoditização. Com o avanço do capitalismo no século XX, grandes organizações empresariais passam a desenvolver, em departamentos internos ou enquanto atividade final, serviços profissionais.
Proliferam, assim, departamentos jurídicos ou médicos no interior de empresas ou grandes escritórios de advocacia e grandes hospitais. Nesses locais, a atividade do profissional é inserida em uma rotina altamente controlada, dentro de uma lógica burocratizada, transferindo a autonomia pessoal para a organização. Quem decide o que, como e quando fazer não é mais o profissional isolado, mas a estrutura na qual ele se insere.
Em situações hoje cada vez mais comuns, ocorre a proletarização: a rotina é tão fragmentada e controlada pela organização que a pessoa do profissional perde toda a indeterminação em sua atividade, assemelhando-se a outros trabalhadores menos qualificados. Uma imagem dessa situação é o profissional transformado em pessoa que apenas aperta as teclas do keyboard do computador, executando uma atividade previamente determinada, como um médico que apenas realiza um exame, ou um advogado que apenas preenche as lacunas de uma petição pré-elaborada.
Mas além das grandes organizações, outra ameaça séria ao profissionalismo é a comoditização do conhecimento. Para ABBOTT, o conhecimento pode estar em três lugares: nas pessoas, nas organizações e nas commodities. O profissionalismo é um fenômeno típico de pessoas com um conhecimento especializado em comum, organizando-se para obter o monopólio comercial. Nesse processo, podem enfrentar a oposição de organizações que também querem monopolizar o conhecimento, como igrejas e universidades.
O desenvolvimento tecnológico faz surgir outro local em que o conhecimento pode estar: as commodities. O termo designa uma mercadoria cujo valor individual é insignificante, dada sua fungibilidade, como, por exemplo, arroz, feijão ou soja. Um grão dessas mercadorias não vale coisa alguma, sendo economicamente interessantes apenas se negociadas em grande quantidade.
Com as novas TIs (tecnologias de informação) e a internet, haveria uma tendência de todo o conhecimento humano ser disponibilizado em formato digital, a um preço bastante baixo ou gratuitamente. Isso se aplicaria inclusive ao conhecimento profissional, que escaparia do controle do grupo que deseja monopolizá-lo. Ninguém, com isso, pagaria pelo conhecimento de um advogado ou de um médico, pois poderia obtê-lo facilmente em sites da internet.
Com o advento de inovações tecnológicas, poderiam se popularizar sites que elaboram petições judiciais automaticamente, julgam litígios, realizam exames e diagnósticos médicos e sugerem tratamentos a doenças.
As grandes organizações que burocratizam e proletarizam as atividades profissionais aliadas à comoditização geram os maiores desafios já enfrentados pelas profissões contemporâneas. Para seus críticos, isso significa que tais serviços, deixando de ser monopolizados por grupos especializados, poderiam ser prestados com maior eficiência em ambiente de concorrência, democratizando seu acesso. Para seus defensores, a qualidade do serviço cairia, pois jamais uma rotina automatizada ou um programa de computador teriam a mesma capacidade de um humano, nem entenderiam aquele elemento chamado de indeterminação.
A questão final que deixamos é: as profissões desaparecerão ou apenas se transformarão de modo radical? O espaço para a indeterminação diminui gradativamente ou apenas se modifica?
Referências:
- ABBOTT, Andrew. The sistem of professions.
- FERREIRA, Adriano de Assis. Advocacia em Ebulição.
- LARSON, Magali Sarfatti. The rise of professionalism.
- MACDONALD, Keith M. The sociology of the professions.