A digitalização da economia e da política
26/03/2023Para além da clausura política: repensando a ação coletiva em tempos de economia digital e globalização
26/03/2023A era digital tem transformado a política em todo o mundo, com um impacto significativo na forma como as pessoas obtêm e disseminam informações. As redes sociais tornaram-se uma plataforma poderosa para a politização crescente da sociedade, com a democracia de celebridade ganhando destaque nesse cenário. Líderes políticos tornam-se celebridades digitais, e essa mudança tem levado ao surgimento de partidos inteiramente digitais, enquanto os partidos tradicionais também passam por um processo de digitalização.
O uso de dados obtidos a partir das interações nas redes sociais tem permitido aos partidos políticos calibrar suas pautas e estratégias de comunicação. Ao mesmo tempo, políticos celebridades têm criado partidos digitais a partir de suas redes sociais, controlando e manipulando as reações de seus seguidores por meio de algoritmos e estratégias de comunicação para aumentar o engajamento.
Paolo Gerbaudo critica essa estrutura dos partidos digitais, comparando-os a empresas que adotam a lógica de plataformas, como Amazon e Facebook. No Brasil, Marcos Nobre identifica um partido digital bolsonarista que opera de forma não orgânica e corresponde aos seguidores do político. Impulsionado por robôs, esse partido permite ao político “canibalizar” partidos tradicionais.
É importante observar que essas estruturas têm sido mais bem manipuladas pelos candidatos da nova extrema direita, que se beneficiam da conversão dos partidos de esquerda em partidos de Terceira Via ou de neoliberalismo de esquerda, incapazes de apresentar alternativas às crises atuais. Esses políticos mobilizam seguidores através de temas polêmicos, como a defesa da família cristã, o recurso às religiões neopentecostais e o medo do estrangeiro e do diferente, utilizando argumentação muitas vezes distante da racionalidade e próxima do pensamento mágico:
- Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria desde 2010, é um líder de extrema direita conhecido por suas políticas nacionalistas e anti-imigração. Orbán tem trabalhado para consolidar o poder e limitar a atuação de organizações internacionais e da mídia independente na Hungria. Sua retórica agressiva e medidas autoritárias, como a aprovação de leis restritivas à liberdade de imprensa, têm levado a críticas de que ele está comprometendo a democracia no país.
- Rodrigo Duterte, presidente das Filipinas desde 2016, é conhecido por seu estilo de liderança autoritário e polêmico. Sua abordagem violenta à guerra contra as drogas tem gerado preocupações sobre violações dos direitos humanos, com milhares de mortes extrajudiciais ocorrendo sob seu governo. Duterte também tem uma retórica agressiva, muitas vezes fazendo declarações polêmicas e insultando líderes internacionais.
- Donald Trump, 45º presidente dos Estados Unidos (2017-2021), alcançou notoriedade por seu estilo de liderança controverso e polarizador. Ele utilizou as redes sociais, especialmente o Twitter, para se comunicar diretamente com o público, muitas vezes gerando divisões e desinformação. Trump adotou políticas nacionalistas e anti-imigração, além de promover teorias da conspiração e negar a realidade das mudanças climáticas.
- Matteo Salvini, político italiano e líder do partido de extrema direita Lega Nord, é conhecido por suas políticas anti-imigração e eurocéticas. Durante seu mandato como ministro do Interior da Itália (2018-2019), Salvini implementou medidas rigorosas contra a imigração ilegal e fechou os portos italianos para navios de resgate de migrantes. Ele também tem uma forte presença nas redes sociais, onde promove sua agenda e critica adversários políticos.
- Jair Bolsonaro, presidente do Brasil eleito em 2019, é um ex-militar e político de extrema direita com posições conservadoras em questões sociais e ambientais. Bolsonaro gerou controvérsias com suas declarações sobre minorias, gênero e meio ambiente, além de minimizar a gravidade da pandemia da COVID-19. Sua liderança foi marcada por um estilo autoritário e confrontador, especialmente em relação à mídia e instituições democráticas.
- Narendra Modi, primeiro-ministro da Índia desde 2014, é líder do partido nacionalista hindu Bharatiya Janata Party (BJP). Modi tem sido elogiado por suas reformas econômicas e por impulsionar o crescimento da Índia. No entanto, ele também enfrenta críticas por suas políticas e retórica que favorecem a maioria hindu em detrimento das minorias religiosas, como os muçulmanos, e por limitar a liberdade de imprensa e a dissidência política.
Alguns autores caracterizam esse movimento como uma crise da democracia, enquanto outros acreditam que estamos diante de uma readequação democrática. Nesse contexto, o Estado e a representação estatal deixam de ser a forma de mediação entre o cidadão e o político, sendo substituídos pelos meios digitais. As consequências desse processo, sobretudo para grupos minoritários ou socialmente enfraquecidos, ainda são desconhecidas.
Em suma, a política está se tornando cada vez mais digital, e os partidos digitais estão desempenhando um papel fundamental nessa transformação. A emergência da extrema direita e o papel das redes sociais na politização da sociedade são fenômenos interligados que devem ser analisados e compreendidos para que possamos enfrentar os desafios e oportunidades que essa nova era política nos apresenta.